Festival forma público aberto a novidades

Formação de um público especial no Conexão Vivo. Crédito: ©Netun Lima/Conexao Vivo

Minha última aventura musical aconteceu entre sexta-feira e domingo em Belo Horizonte, mais precisamente no belo Parque Municipal da capital mineira. Lá, pela sétima vez, rolou uma etapa do Conexão Vivo, festival que move seus tentáculos por várias partes da cidade há 12 anos e também ocorre em outros cantos do Brasil. Só em 2011 foram mais de 40 edições do evento pelo país, sempre com uma oferta incrível de novos artistas, gente que por algum motivo nunca saiu do underground e encontros singulares.

Na condição de editor de música da revista Bravo! e colaborador da Rolling Stone, volta e meia sou convidado para conferir festivais desse naipe. Apesar de já ter feito a cobertura de um Conexão Vivo em Salvador, a versão mineira seguia inédita para mim. Posso dizer que me surpreendi com o que vi por lá. Não só pela qualidade dos artistas selecionados, mas por poder interagir com a numerosa e interessadíssima plateia presente, que se locomovia com fome de música entre os dois palcos montados no parque. Ao longo de quatro dias, 18 mil pessoas compareceram no local, mesmo com o Los Hermanos e outras atrações apetitosas passando por Belo Horizonte no mesmo período. Constatei que o festival efetivamente formou um público aberto a novidades, desde que vendidas de uma maneira que estimule os sentidos (barraquinhas de comida senegalesa, pastel de angu, caldinhos e bancas de discos ajudavam a compor o cenário agradabilíssimo). Nem preciso dizer que isso tem tudo a ver com a proposta do Movimento Hot Spot. O Brasil é carente de plataformas para revelar gente boa e de meios que sustentem esses talentos para que eles não desistam no primeiro obstáculo mais cascudo.

Pedro Morais participou do show de Lucas Avelar. Crédito: ©Netun Lima/Conexao Vivo

Logo na minha primeira noite, me surpreendi com a receptividade ao trabalho de Pedro Morais, jovem promessa local, que participou do show de Lucas Avelar. Ambos têm o mesmo interesse em MPB e música suingada, mas era Pedro que me interessava mais, pois ele foi selecionado numa outra curadoria em que participei este ano. Potencial é o que não falta para o rapaz. Esse dia foi encerrado por BNegão & Os Seletores de Frequência, que fizeram o pré-lançamento do seu segundo álbum, “Sintoniza Lá”. O grande momento rolou no bis, quando o ex-Planet Hemp citou os rappers Sabotage, Speed e Skunk, todos afinados esteticamente com BNegão e mortos prematuramente.

BNegão & Os Seletores de Frequência fizeram o pré-lançamento do seu segundo álbum, “Sintoniza Lá”.Crédito: ©Netun Lima/Conexao Vivo

No sábado, o que chamou a atenção foi a força da música paraense. No dia anterior, a revelação de Belém, Felipe Cordeiro já tinha feito um dos melhores shows do Conexão Vivo. Já o sábado contou com boas performances da paraense Juliana Sinimbú, que recuperou com propriedade o carimbó “Embarca Morena”, lançado pela lenda Pinduca nos anos 70, do grupo candango Soatá, que mistura rock pesado com carimbó (e também lembrou Pinduca na composição autoral “Funkarimbó”) e do Baiana System, que apesar de se basear na junção de guitarra baiana com ritmos jamaicanos, também estende sua pesquisa até a região amazônica, especialmente no tema “Da Calçada Pro Pio Lobato”, homenagem ao guitarrista mais cultuado no Pará hoje. Quem encerrou a festa foi Magary Lord. Além de enfeitiçar geral com o hit “Inventando Moda”, o cantor baiano resgatou “Vida”, que ficou conhecida com o grupo brasiliense Obina Shok nos anos 80. Nunca os ritmos africanos foram tão bem representados por um artista que transita no terreno da axé music como no trabalho de Magary. Os guitarristas que o acompanham são dois monstrinhos. Tocam muito.

Magary Lord encerrou a noite de sábado do festival enfeitiçando a plateia com o hit “Inventando Moda”, Crédito: ©Netun Lima/Conexao Vivo

A última noite trouxe uma performance entre o jazz e o rock do Aeromoças e Tenistas Russas, de São Carlos (SP). Totalmente instrumental, o grupo se sai melhor nas músicas em que o saxofone fica em primeiro plano. Outra atração instrumental do domingo foi o Bixiga 70, que parte do afrobeat (gênero criado pelo nigeriano Fela Kuti) para achar as suas próprias raízes afro-brasileiras. Coube ao também paulistano Garotas Suecas representar o rock na data. A boa banda, que lança álbum novo este ano, aproveitou o clima quente do evento (apesar do frio na casa dos 14 graus) para mostrar uma canção inédita: “New Country”. No próximo fim de semana, o Conexão Vivo se muda para a Praça do Papa, prometendo shows memoráveis da banda pernambucana Volver, dos baianos Ilê Aiyê e Orquestra Rumpilezz, e de Pipira do Trombone, Pantoja do Pará e Manezinho do Sax, que formam o fantástico Metaleiras da Amazônia. Se eu estivesse em Belo Horizonte, não perderia por nada.

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